Meus
natais, na infância, tinham cheiro de tinta fresca: Paredes e janelas pintadas
de novo.
Cheiro
de cera em pasta.
As
donas ficavam de bundas para cima ao esfregar o chão. Arrastando-se, de fasto,
até a derradeira porta.
Depois
a dança dos panos sobre os pés: A enceradeira.
Cheiro
de óleo de peroba;
de
cortina nova;
lençóis
novos.
Em
minha casa haviam uns vergalhões pintados de verde, da cor da janela,
transpassando dois pedaços de madeira, chumbados às paredes, serviam de suportes
para as cortinas. Ali, mamãe pendurava cortinas transparentes, de filó, de
plásticos, coloridas.
Tapetes
à porta.
Senhoras
batendo tapetes, lavando tapetes...
Nós
tínhamos uns tapetes trançados com restos de tiras de pano: Mamãe dizia que
eram passadeiras.
Garrafões
de Vinho; cheiros de vinho.
Em
todas as casas, os mesmos garrafões, embaixo das mesas da cozinha, no canto dos
armários.
Árvores
de natal.
Não
tínhamos árvore de natal no começo.
As
casas tinham galhos, de pequenas árvores, fincados em latas, cobertos por
algodão: Bolas coloridas, descascadas, papais Noéis de plástico. Tudo tão
simples como a própria manjedoura do menino Jesus!
Gosto
de castanha.
Em
todas as casas, cheiro de rabanadas.
Músicas
no ar, misturadas ao burburinho, aos risos contagiados de alegria natalina.
Havia
sempre uma roupa nova.
Lembro-me
de um vestido azul de babados, passado cuidadosamente para vestir meu corpo de
menina-moça.
Em
minha casa, algumas rabanadas e pastéis. Outras guloseimas nas mesas vizinhas.
Visitávamos
uns aos outros.
Os
homens se embebedavam de vinho, enquanto falavam amenidades e riam.
Amigo
oculto.
Parentes
de longe; lágrimas de surpresa e alegria.
Meninos
correndo morro à cima, morro a baixo, num gozo de dar gosto!
Natais
de sapatos na janela e de janelas sem grades;
de
portas abertas.
Os
meus sapatos ficavam dentro de casa.
Só
podíamos ficar acordadas, eu e minha irmã, até meia noite.
Íamos
dormir como se deitadas em nuvens de sonhos.
Quando
amanhecia o dia, corríamos para os sapatos, acreditando, piamente, na fantasia
do bom velhinho:
Uma
enfermeirinha de plástico branco, com uma cruz vermelha na frente do chapéu,
também de plástico, agarrado à cabeça.
Para-pedros,
bonequinhos comuns naquela época-, de fraldinhas vermelhas e azuis.
Minha
irmã, certo natal, ganhou um bonecão chamado Jorge-shortinho e camisa de
botões, feitos por mamãe.
Vestíamos
a roupas de Jorge no gato pompom, que sempre voltava sem os shorts.
O
presente que mais povoa minha recordação é um fogãozinho de plástico, cujo botijão
Zinho, ficava nele pendurado.
Uma
bandeja com uma jarrinha de suco, quatro copinhos e k’suco de groselha.
Num
outro natal, mais abastado, um fogão com trempes soltas, fornos que se abriam,
e botões que giravam. Presente para minha irmã.
Ganhei
um telefone azul, com as tampas do fone brancas, disco que girava e som de
chamada. As crianças da rua acreditavam que era de verdade.
Certo
natal ganhei de um vizinho um jogo de quarto em madeira: Guarda-roupas,
penteadeira, e caminha com colchão. Não soube cuidar daquela relíquia, que logo
se quebrou.
Mamãe
usou seu décimo terceiro salário, para nos dar o presente mais caro. Duas
bonecas, com cabelos lisos e olhos que se fechavam ao deitá-las. A minha
chamou-se Edna: Morena de olhos verdes-, e a de minha irmã Adriana, loira de
olhos azuis.
Nossos
presentes eram simples, mas de uma riqueza, que os recursos de hoje não podem
comprar.
Meus
natais tinham gosto de felicidade que jamais consegui provar novamente.
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